Opinión

Cesária Évora canta em galego

Do 11 ao 26 do presente mes de julho decorre na linda cidade de Viana do Castelo a 29 Feira do Livro da Lusofonia. No acto de abertura da noite do dia 10 actua a maravilhosa cantautora Cesária Évora do arquipélago africano e lusófono de Cabo Verde. Nascida o 27 de agosto de 1941 na cidade portuária de Mindelo, da ilha de S. Vicente, está hoje considerada como uma das melhores cantantes de todo o grande continente africano. Conhecida com o sobre-nome de Rainha da morna e Diva dos pés descalços (polo seu costume de apresentar-se com os pés nús nos cenários das suas actuaçoes, para solidarizar-se com os do seu país, os sem teito, as mulheres e as crianças), é todo um prazer escoita-la, porque ademais canta em galego, o nosso formoso idioma que os portugueses levaram polo mundo. Galegos e galegas temos a sorte de entender perfeitamente quando canta as letras dos seus lindos cantares. Relacionadas com temas que som muito nossos, como a morrinha, a nostálgia, o exílio da emigraçom, a separaçom familiar pola distância, a saudade...


Cabo Verde, o seu país, situado a 560 quilómetros da África Occidental, foi infelizmente um lugar histórico muito importante para o tránsito e comércio de esclavos. Ademais de ser, como Galiza, durante séculos, terra de emigrantes. Em Burela temos uma interessante colónia de cabo-verdianos e o outro dia vieram ver a minha biblioteca Tagore dous professores do país. Os que me comentaram que o número de cabo-verdianos que moram no exterior é maior que a povoaçom da sua naçom. Convidaram-me a ir a Cabo Verde para orientá-los na formaçom do professorado em exercício e da renovaçom pedagógica do seu ensino, pois pertencem a uma associaçom de docen tes preocupados por este tema. Os professores Felisberto Moreira e Lúcio Cabral, que estes som os seus nomes, dirigem o Instituto Caboverdiano de Acçao Social Escolar. Nom só ficaram gratamente surpreendidos polo grande valor da minha biblioteca tagoreana, tambem ao ver a infinidade de CDs e filmes que tenho de música e cultura africana. Por exemplo tenho vários compactos de música popular cabo-verdiana, doutro grande cantautor como é Paulino Vieira e 12 compactos de Cesária Évora, que eu admiro e eles amam. Nom podiam imaginar-se isto, nem tampouco que a nossa língua fosse comum, para entender-nos perfeitamente.


Na maioria das cantigas Cesária, de voz muito fina e agradável, está acompanhada por instrumentos típicos do seu país : cavaquinhos, bateria, guitarras, piano, clarinete, harmónica, trompetas e outros mais populares. Posto a destacar eu gosto muito dos seus albumes Mar Azul (1991), Miss Perfumado (1992), Sodade, as mais belas mornas (lamentos) de Cesária (1994),Voz d’amor (2003) e Rogamar (2006). Em 2004 ganhou o prémio Grammy ao melhor album de música contemporánea do mundo, e em 2007 Jacques Chirac, presidente galo, outorgou-lhe a medalha da legiom de honra francesa. Na França esta cantante é apreciadíssima. De origem muito humilde, o seu pai faleceu quando ela tinha sete anos. Com sete filhos, a sua mae passou muitas penalidades como cozinheira. Cesária esteve no orfanato da sua cidade e aprendeu a cantar no coral do mesmo. Desde os 16 anos começou a cantar em bares da sua cidade, por poucos escudos, comidas e bebidas. Por isso a sua música profunda gira arredor do sofrimento, a melancolia e o exílio. Um bom dia Cesária comentou: ‘As minhas cantigas tratam de cousas perdidas, da nostálgia, o amor, a política, a inmigraçom e a realidade. Nós cantamos sobre a nossa terra, sobre o sol, sobre a chuva que nunca chega, sobre a pobreza e os problemas, e sobre como vive a gente em Cabo Verde’.


Depois de muitos anos de oscuridade, já com quarenta anos, dando vários concertos em Lisboa, deu-se a conhecer e o seu produtor José da Silva levou-a a París. Assim iniciou-se o grande sucesso desta cantante, que por língua e cultura, polos temas das suas cantigas e polo sentimento com que canta, tambem é muito nossa. Aconselho aos meus amigos ourensanos e galegos que procurem alguma vez escoita-la. Se nom pode ser em directo, por médio da sua ampla discografia. Seria bom tambem que se deslocaram a Viana este mes, para disfrutar duma cidade maravilhosa e de uma excelente feira do livro, dedicada aos países lusófonos, que têm como comum língua a nossa. Feira esta, organizada tam bem, que pode servir de modelo para copiar os que organizam as nossas na Galiza. Termino com aquele verso dum cantar de Cesária: ‘Cabo Verde no nosso coraçom. Cheias de amor, as nossas maos ham fazer que o verde floresça na terra’.


(*) Professor Numerário da Faculdade de Educaçom de Ourense

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